08/08/2023 às 14h30min - Atualizada em 08/08/2023 às 14h30min

As mulheres não se transformam em mães do dia pra noite

Juliane Silvestri Beltrame
Você já deve ter ouvido a frase: nasce o filho, nasce uma mãe. Me desculpe se hoje vou distorcer essa máxima, mas sinto que mentiram para nós mulheres.
Não há como escapar. Uma mulher precisa receber toda atenção materna, desde a concepção, para dar atenção a sua própria prole. Veja que, embora a mulher tenha um vínculo físico e espiritual inalienável com seus rebentos, ela simplesmente não se transforma em uma boa mãe nos primeiros minutos após o nascimento.
Não, mentiram para nós.
Toda mulher que gera uma nova vida, precisa receber muitas bênçãos, auxílio, estímulo, palavras, empatia das mulheres mais experientes, acolhimento da equipe médica no momento do parto, porque toda nova mãe é uma mãe-criança, sedenta de carinho afeto e compreensão.
Durante séculos vemos o papel das madrinhas, que foram certificadas com o papel religioso, para assegurar que a criança não se afastaria dos preceitos da igreja, mas no fundo, o maior papel delas é com a nutrição de mulher-para-mulher.
Antigamente o círculo das mães seguras (avós, bisavós, sogras, tias) era como um portal para aquela jovem mãe-criança, que tinha no vínculo familiar o maior dos aprendizados. E o que sobra hoje são os chás de bebês, com papinhos, abusos disfarçados de brincadeiras, piadas sobre parto, os aplicativos, as redes sociais substituindo os velhos e sábios conselhos das mães sábias, as grandes senhoras naturais que levam na intuição o traquejo da vida feminina.
É assim, ultimamente, na geração Z em diante, nas palavras da psicanalista Clarissa Pinkoka Éstes: “a jovem mãe choca, dá à luz e tenta cuidar seus filhos absolutamente só”.
Não é à toa que cresce dia após dia a depressão pós-parto, aumentando cada vez mais a necessidade de cuidado na perinatalidade (período que precede e sucede imediatamente o nascimento). Uma pesquisa realizada na Universidade de Michigan, EUA, que contou com 68 puérperas, resultou na triagem de 38,2% positivo para depressão pós-parto, 28,1% para depressão maior. A mesma pesquisa foi realizada no Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, e revelou que 38,8%, das jovens mães apresentaram depressão.
Mães jovens, segurando seus rebentos em uma das mãos e na outra a ponta da caneta para assinar um divórcio.
Meninas mulheres, desiludidas, atordoadas, com o coração partido e cheirando leite, sem qualquer vivência conjugal. Traumas pessoais, sociais afetando mulheres e certificando toda uma geração futura. As expectativas, os sonhos, o príncipe encantado se aniquilam em um borrão da mulher domesticada, caem como ilusões de uma infância perdida cedo demais.
Os dados de ambas as pesquisas mostram velhos conhecidos da clínica da perinatalidade, que são: a fragilidade da rede de apoio, as condições ansiógenas e a violência. São fatores de risco à saúde mental materna. Portanto, para promover a saúde mental na perinatalidade é preciso ampliar e fortalecer a rede de apoio em nível material e emocional, e localizar as fontes/origem da ansiedade e da violência no âmbito individual e coletivo.
Do pai não adianta se queixar, como diria no conto O patinho feio: “Aquele safado, não veio me visitar uma vez sequer”.
Assim, em meio a toda essa turbulência, umas conseguiram ser mães, outras são crianças que fingem ser mães, que lutam sem os pais, que se tornam mães solo, outras sentem repulsa, perdem o fluxo de amor e condenam seu futuro amoroso, pois tiveram seus sonhos encurtados, desiludidas, estão sozinhas. Algumas mães que não tiveram acolhimento, torturam seus filhos, causam traumas cimentados que no futuro assombram as gerações.
Sim, a mãe frágil, sem recursos psíquicos é um verdadeiro cisne criado no meio dos patos, onde não descobriu sua identidade, está perdida, afastada de seu Self criativo, vivendo como espectro.
Nesse local, vejo mãe e filho crescerem de mãos dadas, emaranhadas, isolados da própria natureza e divindade.
Não se preocupe, esse texto não é um final triste e trágico, ou talvez uma sentença de morte. Existe remédio para tudo. O Mestre Jesus nos mostra o caminho há mais de dois mil anos atrás. Confia na sua natureza e segue o aforismo grego antigo: conhece-te a ti mesmo.
 
Por: Juliane Silvestri Beltrame Especialista em Direito das famílias e escritora


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