O abandono afetivo está afetando muitas famílias. A ausência de afeto aos filhos, o abandono, a omissão, a falta de apoio emocional e psicológico causam graves rompimentos nos laços parentais, podendo inclusive, nascer o direito da reparação judicial pelos abalos sofridos.
Abandonar significa em termos informais, não se importar, ignorar, desprezar, se omitir em seu dever de pai e mãe. No que diz respeito à seara familiar o referido abandono pode constituir conduta tipificada no Código Penal, como por exemplos, os crimes de abandono material, abandono intelectual, ambos previstos respectivamente nos artigos 244 e 246 ou ainda, conduta “imoral” e de certa forma também ilegal, como acontece no abandono afetivo.
O dever de cuidar não é uma opção do pai ou da mãe. Dar atenção, cuidado e ter responsabilidade é uma obrigação e, a partir do descumprimento dessa obrigação, é preciso reparar um dano moral que essa criança, esse adolescente sentiu por essa ausência paterna e/ou materna. Por essa ausência de quem deveria e teria o dever de estar presente para que o crescimento dessa criança e do adolescente seja saudável.
Não pagar a pensão alimentícia fixada judicialmente constitui abandono material e fazer apenas o pagamento da pensão alimentícia, sem demonstrar afeto, atenção é um exemplo de abandono afetivo.
Os filhos não são objetos que podem ser abandonados após o nascimento. Os filhos são parte dos pais, possuem sentimentos, memórias, necessidades e dependência até poderem gerir suas vidas.
O abandono afetivo traz consequências emocionais sérias, que podem trazer prejuízos irreparáveis e gerar inclusive as doenças psicossomáticas, que são doenças físicas causadas por problemas emocionais. Alguns exemplos das mencionadas doenças são: transtorno de ansiedade, depressão, isolamento, chegando aos casos graves de suicídio, dentre outras, que devem ser diagnosticadas e tratadas por profissionais especializados, como médicos, psicólogos, terapeutas.
A conduta de abandonar afetivamente alguém que esteja sob seus cuidados, requer atenção e possibilita à vítima, pleitear indenização alicerçada no artigo 186 do Código Civil.
No ano de 2022, o Superior Tribunal de Justiça condenou um pai ao pagamento de indenização por abandono afetivo. A garota processou o pai, que foi condenado a pagar R$ 30 mil pelos danos morais causados pelo abandono familiar quando ela tinha 6 anos. A ministra Nancy Andrighi considerou que: “Os traumas e prejuízos emocionais decorrentes da parentalidade irresponsável podem ser quantificados e qualificados como qualquer outra espécie de reparação moral indenizável”.
Assim, o abandono afetivo se configura na negligência, onde se ausenta a convivência familiar. Muitas vezes alguns pais acham que pagar a pensão basta, mas ser pai vai muito além do sustento financeiro. Existe a responsabilidade do apoio emocional, onde se possibilita segurança à criança.
O direito à indenização, quando a vítima é menor de idade, é o pai ou mãe guardiã que representa na demanda e pode se adentrar em qualquer tempo. Quando se é maior, existe um prazo de 03 anos, a contar da maioridade, conforme art. 206, §3º, V do CC, ou seja, até os 21 anos. Nesse sentido, colhe-se da jurisprudência: “O prazo prescricional das ações de indenização por abandono afetivo começa a fluir com a maioridade do interessado. Isso porque não corre a prescrição entre ascendentes e descendentes até a cessação dos deveres inerentes ao poder familiar”,- (REsp 1.298.576-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 21/8/2012).
Por fim, a indenização não irá apagar a dor e o buraco psicológico, mas poderá financiar tratamentos que possam diminuir a dor, restabelecer o caminho, aliviar a angustia, podendo até conscientizar o alienador e talvez florescer o amor e o laço parental.
Juliane Silvestri Beltrame Especialista em Direito das Famílias e escritora.