11/10/2023 às 11h30min - Atualizada em 11/10/2023 às 11h30min

Granja Modelo perde R$ 700 mil ao mês

A baixa no faturamento ocorreu devido a queda no preço do leite. “Este é um dinheiro que deixa de circular no município e na região”, afirmou Volnei Zandoná

Redação
Sócio proprietário da Granja Modelo e do Compost Barn, Volnei Zandoná, e responsável pelo setor financeiro, Gean Pauletti. (Foto: Igor Vissotto)
A queda no preço do leite continua causando prejuízos aos produtores rurais da região. No Compost Barn – espaço coberto para as vacas, revestido com serragem – da Granja Modelo, situada no município de Palma Sola, o prejuízo é de R$ 700 mil ao mês. A informação é do sócio proprietário da Granja Modelo, Volnei Zandoná.
Hoje a Granja Modelo cultiva, entre área própria e arrendada, 1.100 hectares, disto, cerca de 300 hectares são utilizados para alimentar um plantel de 1.800 vacas. Das 1.800 vacas, 680 estão em lactação, produzindo uma média de 27 mil litros de leite por dia. Esse leite está sendo vendido a R$ 2,40 por litro. Há dois meses estava há R$ 2,80. “O máximo que recebemos este ano foi em abril, onde recebemos R$ 3,20. Se vendermos a R$ 2,22 o litro pagamos os custos operacionais e funcionários, mas não pagamos investimentos”, relata Volnei. Conforme ele, a Granja Modelo conta com 42 funcionários, fora os terceirizados que atendem na parte de silagem, feno e manutenção na ordenha, por exemplo.
Volnei, que atualmente está com 53 anos, trabalha diretamente com vacas de leite há 14 anos. Ele começou na atividade para dar continuidade ao trabalho do pai, desde então, as famílias Crestani e Zandoná realizaram inúmeros investimentos em prol do aumento da produtividade leiteira. “Na época conciliamos a parte agrícola com a produção de leite. Tendo onde e como produzir o alimento para os animais, nossa dedução era que seria o casamento perfeito, mas desde o início da atividade tivemos altos e baixos”, afirma.
Trabalhando no ramo leiteiro há mais de uma década, Volnei afirma que transformando os grãos cultivados e alimentando as vacas sempre foi possível agregar valor. [Exceto quando a soja foi a R$ 200, não tinha transformação que acompanhasse o preço do grão]. “Posso dizer que há um mês o casamento estava perfeito, mas agora a coisa começou a se inverter”.
Conforme dados fornecidos por Gean Pauletti, gerente financeiro da Granja Modelo, em 2022, nos meses de junho, julho e agosto, o leite foi vendido a um preço médio de R$ 3,62; em junho, julho e agosto de 2023 o preço médio foi de R$ 2,59. R$ 1,03 de diferença. “Daquele para este trimestre nossa produção aumentou 25%, o custo de produção variável baixou, comida por exemplo, baixou. Mas a receita é menor, a margem é de 10% a 15% menor que no ano passado”, explica Gean.
 
Sobre a pecuária leiteira, qual o cenário atual?
O pequeno ficando na atividade, o médio saindo e o grande não conseguindo dar um passo para trás. Isso porque, ao montar uma estrutura você tem um valor ‘X’ de custos, se dar um passo para trás, você não paga esses custos, a não ser que comece a demitir. Esse não é nosso pensamento hoje, não pensamos em parar de investir nem em retroceder, muito pelo contrário. Qualquer setor produtivo que tem uma estrutura que depende de funcionários, pensa em aumentar a produção mantendo essa mesma quantidade de funcionários. É o que buscamos, vou gastar mais com a alimentação dos animais, mas os custos fixos se mantêm.
 
O que levou ao cenário em que estamos?
São vários fatores, o primeiro deles é a oferta e a procura. Falando do leite importado, se as grandes redes brasileiras têm condições de comprar um leite lá fora, que é 20% mais barato que no mercado interno, compra lá de fora.
 
Porque o leite é mais barato lá fora?
Tributação, menos burocracia no meio trabalhista, mão de obra lá fora é mais barata, a legislação é mais flexível, há muito subsídio agrícola no geral, vários fatores que para nós representam um custo elevadíssimo. Se contratar um funcionário para tirar leite, por exemplo, ele vai trabalhar 6h por dia, custando em torno de R$ 3 mil líquido, o nosso gasto bruto vai chegar em torno de R$ 4 mil. Vamos pagar cerca de 20% de tributo trabalhista.
Nos empreendimentos em geral quando há mais custos de produção é possível agregar mais valor ao produto final. Com o leite isso não é possível. O produtor não consegue barganhar preço de venda. A indústria busca seu produto todos os dias e você não sabe o quanto vai receber. No nosso trabalho, você entrega leite 30 dias por mês e demora mais 15 para receber.
Trabalhamos dentro da legislação sanitária, trabalhista e ambiental. Isso traz um custo para poder tirar um leite de qualidade. Nos outros países eles ou recebem subsídio ou não são tão cobrados na hora de tirar o leite. O agronegócio, principalmente a pecuária, precisa de licença para fazer qualquer que seja a melhoria, são um ou dois anos esperando. Agora se tiver um probleminha na produção em menos de 2h a Polícia Ambiental bate na nossa porta.
Hoje o nosso leite sai daqui com 3% de gordura, ideal para queijos e produtos lácteos. Eu não recebo nada por isso, enquanto outros países pagam por quantidade de sólidos no leite. Aqui não conseguem nem pagar o leite bruto, imagina se pagassem pelos sólidos.
É um problema federal, falta fazer valer a legislação. Para ter uma ideia, em 2012 criaram uma lei, onde o laticínio não podia carregar o leite sem informar quanto você ia ganhar no final do mês. Isso não é levado em conta.
 
Quais as consequências da queda no preço do leite?
A nossa fazenda está deixando de arrecadar em torno de R$ 700 mil. Estou produzindo 700 mil litros de leite por mês, é R$ 1 real a menos por litro. É um dinheiro que eu iria investir, que eu gastaria em farelo de soja, milho, insumos que compramos na cidade. Consequentemente é um dinheiro que deixa de circular em Palma Sola e região. 
 
O que pode ser feito para mudar a situação?
Devemos primeiro ter uma normativa onde conste quanto leite vem de fora, deixar em pratos limpos. Mesmo que seja importado pelo Mercosul, tem que ter um limite e os mesmos rigores sanitários aplicados aos produtores brasileiros deveriam ser aplicados àquele leite que vem de fora do Brasil.
Temos seis grandes empresas que compram leite no Brasil, a primeira coisa é regular elas, estabelecer um valor ‘X’ do que elas podem trazer de fora, que corresponda a porcentagem que falta no mercado, lembrando que o Brasil não é autossuficiente em leite. Em cima dessa importação tem que cobrar imposto.
Quando houve problema com uma ave em Santa Catarina [uma ave silvestre foi diagnosticada com gripe aviária no litoral do estado] o Japão cortou tudo e foi investigar. Isso nunca ocorre com o leite.
 
O que dizem os políticos?
Semanas atrás estivemos em uma audiência pública em São Miguel do Oeste, com representantes do poder legislativo estadual. Foi uma tarde perdida, não conseguimos sensibilizar o pessoal. A reunião que deveria começar as 14h começou às 15h30, é complicado, eles sabem que quando é às 17 horas o produtor tem que ir pra casa tirar leite. Os deputados falaram sobre as rodovias e outros assuntos e após isso, tivemos uma hora de palestra com Airton Spies, da Epagri.
Ele falou que a solução do leite é a exportação, mandar leite pra fora como acontece com o frango e o porco. No Brasil o custo de produção de leite é muito maior que em outros países, como o Uruguai, Argentina, sem falar na Nova Zelandia. Com o custo Brasil é impossível produzirmos leite com valores competitivos para exportação.
Foi nessa audiência pública que as autoridades nos apresentaram a possibilidade de haver uma triangulação no leite, que vem da Nova Zelândia para a Argentina e o Uruguai, que exportam para o Brasil.
Ao final, deram uns três minutos para os produtores de leite falarem. Não foi trazido para nós perspectiva. Acredito que a intenção tenha sido boa, mas veja o despreparo da equipe do governo, para vir aqui e não mostrar uma luz no fim do túnel.
Da porteira para dentro vemos que os produtores são muito eficientes, tanto que falamos de mais de 40 litros de leite por vaca dia, isso não é qualquer coisa, qualquer animal ou genética, é muito trabalho para chegar a isso. Nós que visitamos muitas fazendas em busca de experiências, vemos isso, da porteira pra dentro os produtores fazem de tudo, o problema é que da porteira para fora não conseguimos fazer nada.


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