09/05/2024 às 09h00min - Atualizada em 09/05/2024 às 09h00min

A invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher

Coluna de opinião do jornal impresso

O trabalho e o cuidado não remunerado ou mal pago realizado pela mulher está contabilizado na crise global da desigualdade, segundo a OXFAM BRASIL, “mulheres e meninas ao redor do mundo dedicam 12,5 bilhões de horas, todos os dias, ao trabalho de cuidado não remunerado – uma contribuição de pelo menos US$ 10,8 trilhões por ano à economia global – mais de três vezes o valor da indústria de tecnologia do mundo; e 90% do trabalho de cuidado no Brasil é feito informalmente pelas famílias – e desses 90%, quase 85% é feito por mulheres.”
No Brasil, as mulheres dedicam até 25 horas por semana para fazerem tarefas domésticas e cuidados, enquanto os homens dedicam cerca de 11 horas, de acordo com um estudo realizado pela FGV. Diante desse quadro, essas mulheres não conseguem se dedicar em outras áreas, ficando isoladas e completamente dependentes emocionalmente e financeiramente dos maridos.
Outro dado importante é a diferença salarial entre homens e mulheres, onde o rendimento das mulheres representa, em média, 77,7% do rendimento dos homens (R$ 1.985 frente a R$ 2.555) e o desemprego também as afeta mais, uma vez que a taxa de desocupação entre as mulheres é de 14,1%, enquanto a dos homens é 9,6%. Taxas essas acentuadas pela violência física e psicológica familiar, não importando a classe social, colaborando ainda mais, na desigualdade de gênero.
Esse trabalho do cuidado, muitas vezes, é não remunerado. E mesmo quando é remunerado, é mal remunerado, sendo totalmente desvalorizado. Profissões ligadas ao cuidado doméstico ou de outras pessoas, como faxineiras, babás, assistentes de técnicos de enfermagem, cuidadoras de pessoas com alguma deficiência, idosos e crianças, compõem a base da pirâmide de renda doméstica. E são as mulheres, sobretudo mulheres negras, a maioria nessas profissões.
Portanto, é preciso olhar para quem é cuidado, como bebês, crianças, pessoas com deficiência e idosos, mas também para quem cuida. Como a gente cuida de quem cuida? Como a gente valoriza esse trabalho? Como a gente remunera isso?
Não existe uma sociedade sem cuidado. O cuidado também é um direito. A mulher muitas vezes abdica de sua profissão para cuidar dos filhos menores, sogros(as), parentes acamados e não recebe nenhuma contraprestação, e quando termina o relacionamento, ainda precisa combater as famigeradas frases abusivas: “Você nunca fez nada”, “Você nunca contribuiu financeiramente”, “Qual é o seu direito?”.
Nos últimos dez anos, o Brasil teve um aumento de 57% na população idosa. Se formos pensar nesse público-alvo, já estamos falando de 30% da população que precisa de cuidado. São números muito expressivos. Com o número de jovens encolhendo, o problema só tende a se agravar ainda mais.
Mulheres talentosas, sonhadoras, mas indisponíveis para alavancarem devido a necessidade (não opcional) do trabalho de cuidado. Mulheres que não são acolhidas, não são valorizadas e sabem que seu trabalho é fundamental. Para que o homem possa crescer e gerar riqueza precisou ter ao seu lado uma mulher que abdicasse de tudo para evoluir economicamente.
A atividade de cuidado precisa ser reconhecida, bem remunerada, isso abriria portas para as mulheres alcançarem seus sonhos e alcançarem melhores posições no mercado de trabalho.
Quando a mulher ganha dinheiro ela investe na família e na comunidade. Todos crescem.
 
Juliane Silvestri Beltrame Advogada especialista em direito das famílias e escritora

 
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