20/01/2023 às 16h04min - Atualizada em 20/01/2023 às 16h04min

45 anos da lei do divórcio

Coluna de opinião do jornal Impresso

Hoje após quatro décadas e meia, percebemos como foi importante o passo dado pela sociedade brasileira ao promulgar a Lei do Divórcio (Lei 6.515/77). Muitos avanços de lá para cá foram necessários, como é o caso da emenda constitucional 66/10.
Não podemos deixar de salientar que durante o Brasil império, só havia casamento religioso e foi com a Proclamação da República, que Rui Barbosa, propôs a instituição casamento civil, para que tivéssemos um estado laico, separado da Igreja.
Naquela época nasceu a liberdade familiar pelas mãos dos senadores Nelson Carneiro e Accioly Filho, onde o afeto e a busca pela realização pessoal, tiveram um olhar apurado, sendo deixado de lado as meras convenções econômicas e políticas.
O código Civil de 1916 autorizou o desquite (divisão de bens, separação dos cônjuges, mas subsistia o vínculo matrimonial) e com a emenda constitucional 9/77, foi incluído o divórcio, trazendo a ruptura do vínculo, alterando o estado civil, mesmo que de forma homeopática na época, porque só aceitava o pedido por uma vez, aos que tivessem mais de três anos de separação judicial ou cinco de fato.
Não podemos deixar de mencionar que o Cristianismo fez com que o divórcio estivesse banido da maioria dos ordenamentos jurídicos, ocidentais, porque se dizia que o divórcio dissolvia a família, aumentava o aborto, reduzia a natalidade, comprometia a educação dos filhos e até hoje, muitas mulheres sofrem em seus lares, com abuso psicológico e violência doméstica em nome dessa crença mantida pelas ordenações do Reino, impregnadas pelo Direito Canônico.
A Lei n. 6.515/1977 regulamentou no Brasil, o chamado sistema dualista: a separação judicial põe termo à sociedade conjugal, ao passo que o divórcio dissolve o próprio vínculo matrimonial, gerando a distinção entre terminar a relação e dissolver o vínculo conjugal, fazendo surgir a possibilidade de um novo relacionamento.
Ne época a mulher desquitada sofria um estigma social, e quando compartilhava uma nova relação não recebia o reconhecimento de uma nova entidade familiar.
Hoje estamos na era do divórcio digital, do direito potestativo, que não requer a anuência do outro cônjuge para o término, da simplicidade da resolução extrajudicial, quando seguir as exigências legais (comum acordo e sem menores) dos acordos e da revolução do direito sistêmico.
O preconceito ainda é uma realidade, os integrantes que passam a ter no registro o estigma de “divorciado”, assume uma carga negativa, apesar do divórcio constituir um direito fundamental do cidadão e uma emanação da liberdade. Sendo esse assunto tema de projetos de lei e artigos acadêmicos para alteração da Lei de Registros Públicos para que no Livro B do Registro Civil da Pessoas naturais conste solteiro ao invés de divorciado.
Tratar as famílias sem entender a psique e os desafios enfrentados por pais e os filhos já é coisa ultrapassada, porque o divórcio pode não ser um ato nefasto como sempre foi pensado, apesar de ainda ter muito preconceito social, e uma ideia conservadora falaciosa.
O conceito de família é interessantíssimo porque ao meu ver, não existe outra morada que oportunize o ser humano a evoluir nos campos cooperativo, econômico, subjetivo, fraternal e empático.
Divorciar implica em viver um luto quanto ao ideal de amor eterno e de família perfeita. Não estou mais interessado nessa relação, não gosto, não desejo, não estou à vontade, está chato, me exaure, bom é isso tudo que representa o divórcio, o fim do propósito em viver juntos, a busca por um companheiro (a) perfeito (a), a busca pela satisfação imediata, a troca, a liquidez, ou seja, uma fantasia inconsciente na busca da famigerada felicidade.
O maior desafio para o Direito das famílias no futuro é o de ser imparcial no respeito e na proteção das famílias, em sua pluralidade, sem impor ideologias, crenças e regras sociais.
Cada um dos membros da família tem suas particularidades, necessidades e vulnerabilidades, devendo antes de tudo a lei proteger essa individualidade.
Um divórcio bem feito é aquele que restitui a funcionalidade da família, ou seja, os pais procuram quebrar o enlace conjugal para melhorar a situação dos filhos e acabam prejudicando e sacrificando o bem-estar dos filhos pelo tramite processual.
O certo é que pais infelizes fazem filhos infelizes, portanto, o superior interesse é o familiar, assim o divórcio não é contra o casamento, ele dá chance a quem não entende o que é servir o outro, de recomeçar e reaprender, mesmo que seja através da dor do processo do divórcio.
O ser humano não nasce com seus instintos totalmente apurados, precisa ser educado, alimentado e uma das melhores formas é através do enlace conjugal, o que é decisivo é não buscar a felicidade no outro, se assim fazer, tem o divórcio para inverter o rumo e seguir o desejo da felicidade.
 
Por: Juliane Silvestri Beltrame Especialista em Direito das Famílias.
 
 
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