Você já imaginou caminhar sete quilômetros a pé, todos os dias, para estudar, levando apenas uma batata-doce na mochila como lanche? Foi assim que começou a história de Rozangela Moccelini, campoerense da linha São Brás, filha de agricultores e hoje secretária de educação, cultura e turismo do município de Campo Erê. De origem humilde, ela construiu uma vida inteira em torno da escola, primeiro como aluna, depois como professora e, hoje, como gestora pública.
Rozangela nasceu e cresceu no interior de Campo Erê. Filha de agricultores vindos do sul de Santa Catarina, ela carrega o orgulho da terra onde nasceu. “Meu umbigo está enterrado ali”, costuma dizer, referindo-se ao sítio que pertenceu a seu pai e que ela e o marido, Adilço José Moccelini, também professor, compraram anos depois com o salário dos dois.
Na infância, o cotidiano era puxado: trabalho no campo, responsabilidades dentro de casa, e uma vontade enorme de estudar: “Eu chorava para não ir para a roça”, lembra. Na comunidade onde morava, a escola ia só até a 4ª série. Para continuar os estudos, precisava sair de casa ainda de madrugada e percorrer sete quilômetros até Três Voltas: “A gente ia em grupo, a pé. Era o único jeito”.
A referência e inspiração veio cedo, na figura da professora Terezinha Cadore Ordakoski: “Ela era bonita, cheirosa, amada. Tinha presença. Para mim, criança da roça, ela era rica. Era isso que eu queria ser”, conta Rozangela, que terminou o ensino fundamental aos 14 anos e decidiu seguir o mesmo caminho da sua professora: educar.
Começou sua carreira no antigo CEBEM (Centro do Bem Estar do Menor), hoje Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos, na Assistência Social. Com o tempo, atuou como professora da Educação Infantil e ocupou diversos cargos de gestão escolar: foi diretora de várias instituições, como o CEI Turma da Mônica, a Escola João Telles Padilha (por duas gestões), Irma Florêncio e a Escola Maria Nelly.
Os desafios da época para poder estudar
Após um breve período estudando em Pato Branco, voltou para Campo Erê para cursar o magistério no colégio CNEC. Mas, como os pais não podiam mandar dinheiro todo mês, teve que trabalhar como doméstica para se manter: “Eu morei de favor, trabalhei como faxineira. O que eu ganhava não dava pra pagar tudo: pensão, comida, escola. Tive que me virar”, lembra. “Isso tudo me fez ser do jeito que sou hoje. Porque eu não tive nada fácil”, destaca a atual secretária.
Aos poucos, foi conquistando espaço na profissão. Assumiu turmas de alfabetização, e passou 34 anos em sala de aula, especialmente com alunos do 1º ao 3º ano: “Ensinar a ler e escrever é mágico. A gente vê o mundo se abrindo diante dos olhos da criança”, diz Rozangela. Firme, exigente e disciplinadora, ela se tornou referência entre pais e alunos. “Sou braba, sim. Sempre fui. Mas é por amor. A criança precisa de rotina, de segurança e o professor precisa estar presente, com compromisso”.
Brigando pela Educação
Desde 2021, Rozangela está à frente da Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Turismo. É a primeira vez que ocupa um cargo de confiança e tem enfrentado os desafios da gestão com a mesma postura firme que tinha em sala de aula: “Hoje a gente lida com problemas diferentes: muita burocracia, licenças, faltas, organização. Mas o compromisso é o mesmo”.
Filiada ao PT desde 2022, ela diz que sempre esteve ao lado dos professores, mesmo antes da filiação. “Já enfrentei prefeito, já briguei com jurídico e com colegas. Pela educação, eu brigo. Pelo professor que quer trabalhar, eu brigo. E brigo mesmo, meu compromisso é com as crianças”.
Construindo a vida através da Educação
Rozangela é casada com o professor Adilço José Moccelini, natural de Campo Erê, e juntos construíram uma bela família. Têm dois filhos: Bárbara, dentista e doutora em odontopediatria pela UFSC, e Alisson, professor de educação física. A neta Maria, de 8 anos, é o xodó da avó e é mais uma geração criada com os mesmos valores de esforço e estudo.
Apesar de hoje ter uma vida mais estável, Rozangela não esquece do passado e se preocupa com os rumos da juventude. “Hoje tem lanche bom, transporte, programa que paga pra estudar. Mas falta vontade e propósito por parte dos alunos. Antes a gente estudava pra sair da roça. Hoje tem quem estuda pra voltar, mas com conhecimento. O campo exige técnica agora. Só a terra não basta”.
Ela observa com atenção o impacto da tecnologia e da facilidade no aprendizado: “Tem muita informação, mas pouca vontade de aprender e a escola perdeu um pouco do respeito, da autoridade do professor. Antes, os pais apoiavam a escola. Hoje, nem sempre”.
Mesmo assim, ela segue acreditando no poder transformador da educação: “Eu sonho com uma escola pública forte, com professor comprometido, com criança feliz na sala de aula. Eu tive uma professora que me inspirou e quero que cada aluno também tenha uma”.
Com uma história de superação, disciplina e compromisso, Rozangela Moccelini se tornou mais que uma educadora: é símbolo de resistência, de vocação e de amor por Campo Erê. Porque, como ela mesma diz: “não trabalho por prefeito, não trabalho por cargo, eu trabalho pelas crianças”, conclui a secretária de educação, cultura e turismo, Rozangela Moccelini.
